A importância do trabalho com imagens em sala de aula
Sociedade das imagens: o termo parece lugar-comum. Afinal, por toda parte encontramos fotografias, quadros, outdoors. É como se...
Berlim, 1941.
Hans Edelmann, pesquisador do Instituto de Investigações Atômicas Kaiser Wilhelm, fotografa clandestinamente os planos secretos em que está trabalhando, para construção da primeira bomba atômica do mundo.
Informado desses planos, o Partido Comunista alemão deseja que essas informações cheguem a Moscou, para que o governo soviético consiga também dispor de arma igual, o mais rápido possível.
A pessoa escolhida para levar os planos à União Soviética é Santi, um jovem comunista que, para cumprir a missão, se alista na Divisão Azul, um agrupamento militar de jovens voluntários, formado na Espanha, para lutar na Segunda Guerra ao lado dos nazistas alemães.
Divisão Azul é um relato empolgante, com final surpreendente. Construído pelo entrelaçamento de textos e desenhos perfeitamente ambientados, proporciona ao leitor reflexões importantes sobre escolhas pessoais, o impacto do amor em nossas vidas, os significados de uma guerra e os caminhos da humanidade.
Divisão Azul reúne um universo textual-artístico voltado ao público jovem. Narra as aventuras e desventuras de um jovem soldado infiltrado em um batalhão de voluntários inimigos, movidos por ideais contrários ao seu, durante a Segunda Guerra Mundial. A história ficcional de Santi, em outras palavras, se passa em um contexto bem real, com consequências que podem ser notadas em nossa sociedade até os dias de hoje.
Em junho de 1941, Adolf Hitler (1889-1945), o líder da Alemanha nazista na Segunda Guerra Mundial, determinou a invasão da União Soviética, rompendo o pacto de não agressão que havia firmado com o líder comunista, Josef Stalin (1878-1953), em 1939. Na Espanha, a notícia foi recebida com entusiasmo por aqueles que tinham vencido a Guerra Civil (1936-1939) e que viam a Alemanha como um novo e invencível império, capaz de barrar o avanço comunista.
O governo espanhol, porém, não podia entrar na guerra como aliado da Alemanha, pois o país se declarara nação não beligerante e se encontrava esgotado após a guerra civil que deixara cerca de um milhão de mortos. Nesse contexto, surgia a Divisão Azul, grupo de voluntários espanhóis organizado em um destacamento para reforçar o exército alemão em seu avanço rumo a Moscou.
O recrutamento desses voluntários foi feito em meio a grande euforia. O primeiro contingente de 16 mil soldados voluntários partiu em julho de 1941 e seria seguido por tantos outros: segundo estimativas, passaram pela Divisão Azul 47 mil indivíduos, mais da metade dos voluntários europeus que reforçaram o exército alemão.
Sobre as operações bélicas da Divisão Azul em território russo, podemos encontrar muita informação nas enciclopédias. Ao contrário do que se imagina, não era um destacamento motorizado. Com apenas alguns caminhões para administração, era hipomóvel, com as peças de artilharia sendo movidas por cavalos e mulas.
Outro mito aponta que a Divisão Azul era colocada em luta entre os alemães e os soviéticos, usada assim como uma espécie de bucha de canhão para enfraquecer o opositor. Não foi assim: o batalhão operava sempre sob o comando espanhol e agia em paralelo com outras divisões alemãs. Em fevereiro de 1943, na Batalha de Stalingrado, uma das mais sangrentas dessa guerra, a Divisão Azul começou a atuar na defensiva, até que em outubro se retirou da frente de batalha.
Ficou então estacionada perto de Berlim até dezembro daquele ano, quando começou a ocorrer o repatriamento pela fronteira da cidade espanhola de Irun. No entanto, cerca de dois mil homens permaneceram na chamada Legião Azul até março de 1944. Desses, aproximadamente quatrocentos se alistaram depois na Nova Legião e várias dezenas ingressaram na polícia política alemã e participaram, até maio de 1945, na última e desesperada defesa de Berlim.
Estima-se que o saldo de toda a Divisão Azul seja de cerca de 8 mil mortos, 11 mil feridos, mais de 2 mil mutilados e 572 prisioneiros – sendo que, desses, 286 sobreviveram a quase 15 anos de prisão soviética, conquistando anistia apenas depois da morte de Josef Stalin, em 1953. Assim, as últimas fileiras da Divisão só voltaram para casa três meses antes de Elvis Presley gravar seu primeiro single, em 1956. O mundo já era outro.
O fim da Segunda Guerra Mundial marca a entrada da humanidade nos conflitos atômicos. As pesquisas que desenvolveram a tecnologia desse armamento estavam assim a todo vapor enquanto o conflito se desenrolava. Na Alemanha, o nome do projeto secreto que desenvolveu essa tecnologia era Projeto Urânio. Fora ativado em 1939, no mesmo ano em que a Segunda Guerra Mundial começou e poucos meses depois que o físico alemão Otto Hahn (1879-1968) descobriu que a fissão nuclear era possível.
Esse projeto, ligado ao departamento de produção de armamentos, tinha como objetivo pesquisar sobre a possibilidade de usar em cadeia a reação que se produz após a fissão nuclear, obtendo um poder de destruição até então inimaginável. Seria, acreditava-se, uma arma definitiva. Três equipes trabalharam paralelamente: a primeira realizava pesquisas para obter um reator de motor submarino.
O segundo grupo desenvolveu a separação do Urânio 235 (U235) com uma técnica de centrifugação do hexafluoreto de urânio. A terceira equipe era controlada pela SS, a polícia do governo nazista. Seu chefe, Heinrich Himmler, era o único a conhecer a pesquisa em sua íntegra. Alguns historiadores afirmam que o desenvolvimento da bomba estava bem próximo quando o nazismo foi derrotado.
A principal diferença entre as pesquisas alemãs e as do Projeto Manhattan, desenvolvido pelo governo dos Estados Unidos com o mesmo objetivo, era o método de centrifugação de urânio. Aquele utilizado pelos alemães era bem mais rápido e só foi obtido pelos estadunidenses após a captura dos cientistas alemães que participaram do Projeto Urânio.
Detidos em um prédio chamado Farm Hall, perto de Cambridge, foram colocados microfones ocultos nas salas em que estavam esses cientistas, para gravar suas conversas que, uma vez transcritas, eram enviadas ao diretor militar do Projeto Manhattan. Entre os detidos estava Otto Hahn, o pai da fissão nuclear, que durante a prisão caiu em profunda depressão após ver sua descoberta culminar nos ataques de Hiroshima e Nagasaki, feitas pelos Estados Unidos.
Os soviéticos, que não tinham seu projeto nuclear tão avançado, conseguiram a bomba atômica em 1949, dando o tom à Guerra Fria que marcaria o mundo nas décadas seguintes. Para isso, foi fundamental os documentos que obtiveram no Instituto de Pesquisa Atômica ao ocupar Berlim antes dos Estados Unidos: o material ali encontrado foi enviado para Moscou sem perda de tempo. Pequenos detalhes que escreveram a História!
Em qual lugar da estante você colocaria Divisão Azul? A trama construída nesse romance gráfico convida seu leitor a refletir sobre diversas das inquietações que marcam a juventude nos dias de hoje, entre elas as maneiras de estabelecer relações interpessoais e coletivas e as preocupações e dilemas pertencentes à individualidade de cada ser – nesse caso, tratando de assuntos como as relações afetivas, os ideais que mobilizam o indivíduo, as relações hierárquicas, as questões sobre pertencimento e mesmo o envelhecer.
Ao se alistar na Divisão Azul para poder ser aceito como um igual, Santi é obrigado a se adaptar a pessoas com valores bem distintos dos seus. Para isso, procura compreender aqueles colegas, unidos aparentemente por um objetivo comum, mas que apresentam individualidades e subjetividades bem distintas. Nesse movimento, ele aceita e refuta diferentes pontos de vista e modos de agir, ora se aproximando, ora se afastando do grupo.
Nessa história de Santi, porém, há uma peculiaridade determinante. Ao contrário da maioria dos jovens, que para se adaptar a diferentes grupos podem experimentar mudanças de jeitos e estilos, trocando roupas e cortes de cabelo, por exemplo, o nosso personagem encontra-se limitado por uma guerra e um ambiente militar, com pouco espaço para experimentação e incontáveis limites colocados pela hierarquia, pelas regras da instituição e pelo momento vivido.
Nesse ponto, temos outro dilema que comumente marca a juventude: as relações hierárquicas e as formas de lidar com a autoridade externa. Santi, muitas vezes, parte para o embate, em especial com seu comandante, principal fonte de discordância – chega, inclusive, a ser cúmplice de um ato violento contra esse homem, que antes o havia agredido.
Em nosso dia a dia, estamos cercados por relações hierárquicas – na escola, na família e nas muitas outras interações sociais. A lado de Santi, podemos construir uma percepção da importância de estabelecer um equilíbrio entre o sentimento de rompimento e o de aceitação. Adquirir um crescimento emocional importante para enfrentar situações futuras, como as que marcam as relações de trabalho. E também perceber a importância de se construírem espaços respeitosos à contestação e que possibilitem o debate democrático, a escuta e a discussão com ética.
Santi, um jovem comunista que, para cumprir uma missão, se alista na Divisão Azul, um agrupamento militar de jovens voluntários, formado na Espanha, para lutar na Segunda Guerra ao lado dos nazistas alemães.
Kizua é um menino de nove anos que é surpreendido pelo ataque de mercadores de escravos a sua comunidade, no interior da África, e, junto a seus pais, é levado à força até o mar, que tanto desejava conhecer.
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Histórias em quadrinhos nos encantam e não é de hoje. Caracterizadas por serem narrativas que reúnem a linguagem verbal em conjunto...
Fran Jaraba, autor de Divisão Azul, nasceu em Pontevedra, Espanha, em 1957. Formado em Arquitetura, trabalha como ilustrador e professor de Desenho no ensino básico. Foi um dos pioneiros na produção de histórias em quadrinhos na Galiza, comunidade autônoma localizada no norte da Espanha. Em 1979, quando iniciou sua trajetória, participou da edição do fanzine Xofre, mergulhando pelo universo dos quadrinhos que buscam refletir a realidade de seu país.
Desde então, Fran Jaraba já trabalhou em mais de 70 títulos para diversas editoras espanholas, vários deles incluídos na The White Ravens, seleção de publicações organizada todos os anos pela Biblioteca Internacional de Munique, Alemanha, com obras vindas de diversos países para participar da Feira do Livro Infantil de Bolonha, na Itália, uma das mais importantes do mundo.
A primeira aproximação com cenários históricos, experimentada por Fran Jaraba, foi com Cita en La Habana, ambientada na Guerra de Independência de Cuba (1895-1898). Divisão Azul pertence a essas narrativas com contextos reais e teve sua primeira publicação em 2013, sendo reeditado na Espanha em 2020. Entre os prêmios que Fran Jaraba ganhou, destacam-se o Ourense de Banda Deseñada (1999); Curuxa (1989) e o Pardo Bazán del Ministerio de Educación de España (1988).
Convidado para apresentar Divisão Azul aos leitores brasileiros, Fran Jaraba nos enviou esse texto:
Lembro muito bem como embarquei no projeto desse livro. Queria construir uma história ambientada na Guerra Civil Espanhola, especificamente sobre as Brigadas Internacionais [As Brigadas Internacionais foram grupos de estrangeiros que se formaram em apoio aos republicanos, durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939)]. Porém, quando comecei a pesquisar, deparei-me com a Divisão Azul e parei ali. Percebi que as Brigadas já haviam sido bastante exploradas, de forma que a Divisão pareceu o cenário perfeito para minha história. É um contexto histórico muito interessante para situar uma aventura de intrigas e espionagem, intrincada com uma situação de confrontação ideológica e conflito interior; ao mesmo tempo em que se descreve a vida na Divisão, algo pouco conhecido e explorado na narrativa espanhola e mundial.
Feita a pesquisa, quando comecei a escrever o que desejava, a narrativa veio com enorme fluidez, como se surgisse quase sozinha. O primeiro passo foi estabelecer as personagens ficcionais do enredo, para depois acompanhar sua evolução emocional. Fui me deixando levar pelos protagonistas, por Santi e Marta, até chegar ao final de forma natural, como no ponto em que eles pareciam desejar.
Logo, comecei os desenhos, adotando uma perspectiva realista, também com enorme fluidez. O mais difícil foi unificar graficamente a cor. Perguntaram-me muitas vezes sobre os critérios para a coloração. Sou um pouco anárquico com isso: não seleciono previamente uma paleta de cores, vou procurando essa harmonia e logo trato de buscar a unificação por cenas, brincando com a regulagem digital da coloração.
No começo eu fiquei em dúvida se deveria deixar as imagens em sépia ou em dois tons. Por fim, optei por uma cor um pouco saturada, atenuada, como se faz no cinema, em especial nos documentários de época: algo parecido com o que o diretor Steven Spielberg fez no filme O Resgate do Soldado Ryan (Estados Unidos, 1988), em que incorporou às câmeras lentes autênticas dos anos 1940.
O contexto bélico é muito potente para a literatura, um cenário teatral ideal para tratar questões fundamentais da existência. Tem ali um ponto especial de pressão e intensidade, algo que Homero e Shakespeare já nos mostraram há muito tempo.
A única coisa que se deve evitar é construir esse enredo com um enfoque maniqueísta, com bons de um lado e maus de outro. Todo conflito tem muitas faces. Em meus trabalhos, gosto de deixar claro que toda guerra é horrível. Por isso, o sofrimento da população civil sempre vem refletido de jeito marcante.
Quero comentar também sobre minhas referências, quais autores de histórias em quadrinhos (HQ) influenciaram meu trabalho. Tenho todos eles no meu pequeno altar! Em primeiro lugar, os clássicos europeus: Hugo Pratt (1927-1995, Itália), Jean-Michel Charlier (1924-1989, Bélgica), Jean Giraud (1938-2012, França), Vittorio Giardino (1946-, Itália). Também os quadrinistas estadunidense: Alex Raymond (1909-1956), Milton Caniff (1907-1988), Hal Foster (1892-1982) e Frank Robbins (1917-1994).
Eles, os estadunidenses, inventaram a linguagem, e os europeus trouxeram maturidade a ela. E logo isso volta aos Estados Unidos para retroalimentar as criações de lá. Essa é uma troca interoceânica importante.
Hugo Pratt criou Corto Maltese mas tem uma série dele menos conhecida que é a melhor coisa que já se fez na história: Os escorpiões do deserto (Ala dos Livros, 2019), uma espécie de diário de guerra. E quanto à série Blueberry, que se passa no Oeste dos Estados Unidos, feita por Charlier e Giraud, releio tudo a cada dois ou três anos. É uma releitura obrigatória, como a de Dom Quixote (Miguel de Cervantes, Espanha, 1605).
Espero que os leitores de Divisão Azul no Brasil divirtam-se tanto quanto eu ao escrever e desenhar as páginas desse romance gráfico.
Um forte abraço diretamente da Galiza (Espanha), onde aliás, muitos não sabem, se fala o galego, língua muito próxima do português.
Fran Jaraba
A tradução para a língua portuguesa de Divisão Azul foi feita por Graciela Foglia e Ivan Martin, ambos professores de Literaturas em Castelhano no curso de Letras da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). Graciela Foglia é doutora em Letras e realiza pesquisas nas áreas de literatura de testemunho, literatura e violência ditatorial, literatura e cinema. O professor Ivan Martin fez pós-doutorado e desenvolve pesquisas sobre representações literárias e artísticas da Guerra Civil Espanhola e sobre ensino e aprendizagem da leitura do texto literário em castelhano. Ambos se dedicam à pesquisa das representações da violência de Estado na literatura e em outras artes.
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